Lúcidas #9 | amizades a distância: como amigas espalhadas pelo mundo se fazem presentes
Ideias pra quem vai e pra quem fica
Ir embora é estar sempre entre duas saudades. Quando a gente vai, sente falta dos amores que ficaram, e quando volta, sente falta dos amores novos. Essa frase eu ouvi da Renata Steffen, uma das minhas primeiras amigas que foram embora. Quando a gente saiu do Rio Grande do Sul pra fazer o Curso Abril de Jornalismo, 20 anos atrás, eu voltei pra Porto Alegre, onde estavam meu trabalho CLT, o então namorado, família e muitos outros amigos. E ela ficou. Começou ali uma carreira brilhante na editoria de Arte das principais revistas brasileiras, fez novas turmas, ganhou prêmios, se passou por sueca no Carnaval, me deu pouso muitas vezes, namorou, casou, teve filho. Uns 15 anos depois, eu cheguei a São Paulo com o conforto de ter uma família de amigas me esperando. Aí a Rê foi embora pra outro país.
Podia ser uma história de amor impossível, mas não lembro de um longo período em que eu e a Rê não tenhamos estado próximas, sabendo da vida uma da outra, fofocando, dividindo dilemas e criando novas lembranças. E não credito isso a um enorme esforço nosso em não nos distanciarmos, mas às conversas sobre qualquer coisa que a gente tem diariamente por grupos de whatsapp, que já foram lista de emails, mensagens no MSN e scraps de Orkut. É nesse papo de dia a dia que a gente fala sobre o nada e sobre tudo e acaba não chegando àquele estágio em que precisa marcar uma conversa só pra se atualizar da vida uma da outra porque perdeu o contato - mas se quiser pode, e faz bem. Não à toa “marcar em meme", “mandar áudio", “falar no whatsapp”, “mandar figurinha” apareceram em muitas das respostas quando perguntamos como cuidar das amizades a distância. Falemos mal do smartphone, mas é preciso admitir: ele é a grande força carregando as amizades a distância desse planeta nas costas.
Tenho muitas amigas que moram longe, seja as que continuam na cidade onde nasci, seja as que bateram asas por esse mundão. Eu tento me manter presente, mas também não acho a coisa mais fácil do mundo. Por isso, pedi pra amigas queridas que moram fora há alguns anos dividirem o que aprenderam nesse tempo sobre manutenção das relações.
As principais ideias você lê a seguir:
Não esperem o “grande momento” em que vocês terão tempo de conversar. Ele raramente chega, e às vezes nessa ânsia de fazermos uma atualização completa acabamos nos perdendo do que está passando na vida uma da outra.
"Bateu saudades, manda um alô. Não precisamos encontrar tempo para contar tudo o que aconteceu no mês, mas sim compartilhar pequenas informações, mesmo que sejam pela metade. Tentar fazer dessas pequenas interações um hábito", ensina a Erica.
A Luíse concorda: “A gente pode pensar ‘nossa, tem tanta coisa acontecendo na minha vida nesse lugar novo, preciso atualizar a fulana, mas quando eu falar com ela precisa ser com calma. Tenho que marcar um dia pra gente conversar’. E às vezes você manda só um oi mesmo, uma figurinha, só pra se manter presente. Nem sempre você vai conseguir colocar todo papo em dia, mas também é importante não deixar esse acúmulo, essa ideia de que precisa encontrar tempo, e às vezes nem precisa ser muito.”
“A primeira coisa que eu penso é que eu amo tecnologia para manter amizade. Quando estou de bobeira, mando uma mensagem para uma amiga perguntando como está ou com um assunto que me fez lembrar dela. Na verdade, não é muito diferente do que eu faria se estivesse na mesma cidade (risos)”, completa a Clarissinha.
Tenho amizades a distância mantidas quase 100% por trocas de memes diárias. É como se a gente pudesse rir juntas de longe.
Serve pra meme mas também pra outras coisas que dizem “lembrei de você”, como mandar um vídeo de um assunto que interessa a amiga ou tirar uma foto de algo que ela gosta. Como faz a Thelma: “Eu vejo uma flor que a pessoa gosta e mando uma foto. Sabe umas coisinhas assim? Ou a pessoa tem uma pergunta que ela sabe que só eu posso responder porque faz parte de um contexto que a gente viveu junto. Sem muita explicação, sem muito ‘ah, a gente tem que se falar!’ Porque quando a gente se fala, a gente se fala. Não ter pudores de entrar em contato, mesmo que seja por uma coisica.”
Deu vontade de entrar em contato sem muito motivo? Aproveita e marca ela nesse post aqui:
Expectativa, culpa e cobrança são 3 cavaleiros do apocalipse pra qualquer relacionamento (o 4o deve ser não falar quando essas coisas incomodam), mas com distância a gente nem tem muita chance de descomprimir. Como diz a Luíse, a expectativa de que nada vai mudar já está fadada ao fracasso, porque não tem como ser igual. “Você encontra um ritmo com cada amiga. Tem amiga que você vai conversar sempre, mandar meme todo dia e tudo bem. Tem amiga que você vai fazer um Skype de quatro horas tomando vinho a cada três meses e é assim que vocês vão manter contato. E tem amigas que você não vai ter contato quando estiver morando longe, mas quando você for visitar ou ela for te visitar, vocês vão conversar e vai ser a mesma coisa”. Amém.
Luíse trouxe um outro ponto importante, a diferença entre responsabilidade e culpa: “Para quem vai, a minha dica é não abraçar a culpa que vem com a partida. Eu vivi muito isso. A pessoa que sai do ambiente das amizades às vezes sente que tem que compensar porque foi embora, e isso não faz bem para ninguém. A gente tem sim uma responsabilidade de regar as nossas amizades, mas também tem que partir sabendo que a nossa mudança de endereço não muda o nosso lugar no coração das pessoas. E confiar que a amizade vai continuar, que vai dar tudo certo, que a dinâmica vai mudar, mas que você não tem que sentir culpa por dar um passo na vida que vai te afastar de pessoas que você ama.”
“Depois de adulta, uma coisa que estraga é a expectativa. Quando tu acha que o outro deve, ou quando tu acha que o outro acha que tu deve. Quando se atinge um grau de amizade que tem uma liberdade total, a amizade profunda, quando você atinge a liberdade de, sei lá, parar de falar no WhatsApp porque aconteceu outra coisa e tudo bem, e entender também quando isso acontece contigo. Liberdade de saber que tá tudo bem”, completa a Thelma.
A gente acaba perdendo aquelas situações em que naturalmente fazemos a manutenção das amizades, como um aniversário, um encontro de turma. Se fazer presente vai exigir um esforcinho, um prestar atenção. Tem gente que cria surpresas, que consegue combinar de viajar juntas, que não esquece um aniversário. Na pandemia, consegui mandar pra família toda de uma amiga que foi morar no Canadá cartinhas e presentinhos simbólicos.
E quando tiver chance de encontros presenciais, tentar aproveitar. “Não consigo conviver com as amigas no presencial, mas estou sempre avisando quando vou estar na cidade ou quando as amigas vêm viajar tento combinar algo. A expectativa é muito legal de finalmente ver a pessoa ao vivo”, conta a Clarissinha.
E a dica de menos cobrança se repete aqui também, nas palavras da Thelma: “Quando tem a chance, fazer questão de ver, mas também, se não rola, tudo bem. Não mandar aquele ‘ah, passou aqui nem falou comigo’. Se não falou é porque não deu, infelizmente. Faz o que for possível para se ver, para se abraçar, para se falar, mas se não for possível, tudo bem. Relax.
E quando finalmente rola de se encontrar, o esforço pra se fazer presente continua na forma de atenção, curiosidade e interesse, como traz a nossa última dica, da Erica.
“Uma coisa muito importante é ter um interesse na vida da outra pessoa, nas mudanças do cotidiano, mesmo que seja uma realidade que tu não entenda por enquanto. Talvez pra algumas pessoas isso seja muito difícil, mas se ela ignora, acaba sendo broxante pra amizade. Quando tu tá longe e tu começa a viver uma outra vida, começa a ter outras referências, outras realidades, outros contextos, faz parte falar disso.”
Amizades a distância foi um dos primeiros temas sugeridos pela comunidade quando lançamos a Lúcidas. Quando há muitos desafios envolvidos, as melhores ideias vêm do coletivo. Por isso abrimos a conversa no Instagram perguntando: como você faz para manter perto as amigas que moram longe? O papo rendeu e vai virar um miniguia da Lúcidas - pra quem vai e pra quem fica.
Como é por aí? Já viveu ou vive alguma amizade a distância? A conversa continua no Instagram, com as dicas da comunidade sobre manter perto as amigas que moram longe. Comente com as suas:
Um beijo,
Larissa Magrisso
Fundadora e Editora-chefe
lucidas.cc
São dicas preciosas, especialmente porque, na vida que levamos, as amigas muitas vezes estão longe mesmo morando na mesma cidade, no mesmo bairro, na mesma rua.