#3 Lúcidas | o maior fã das minhas amigas
Como um cara patologicamente tímido, um engenheiro cujas referências pop congelaram em 1964 e workaholic antes de conhecermos essa palavra de certa forma também inspira Lúcidas?
Nesse dia 31 de Maio faz um ano que meu pai morreu. “Meu pai morreu” é uma frase que aparece na minha cabeça muitas vezes por dia desde que ele se foi, sem aviso, sem dor, tranquila e rapidamente 365 dias atrás. No começo, eu tinha a impressão de que meu cérebro havia se dividido em dois: metade ocupada exclusivamente com a frase “meu pai morreu” - às vezes com tom de notícia, às vezes confirmação, na maior parte apenas um grande e absurdo espanto. A outra metade pensava na vida, trabalhava, ria, chorava, tricotava, conversava, viajava, falava eu te amo, fazia planilha de gastos. Qualquer pensamento cotidiano acontecendo e ao mesmo tempo: "meu pai morreu".
Nas grandes datas esse pensamento, que já vem ocupando menos espaço, volta com força e me peguei pensando na relação dele com as minhas amigas. O que um cara patologicamente tímido, um engenheiro cujas referências pop congelaram em 1964 e workaholic antes de conhecermos essa palavra tinha tanto a ver com isso - e de certa forma também inspira Lúcidas?
Primeiro, como ele sempre sofreu com a timidez, tinha pavor de que eu seguisse seus passos e sempre me incentivou a puxar assunto com outras crianças na pracinha, a aceitar convites pra brincar, a dividir os livros. Mas principalmente a não deixar de dizer pras pessoas quando elas tinham feito diferença na minha vida - coisa que ele se arrependia de fazer, impedido pela timidez. Eu lembro disso muito seguidamente e tento seguir o conselho.
O pai vibrava com as nossas amizades mais do que com Fanta Uva. Queria saber as histórias das colegas de colégio, nos dava aulas de Física e Matemática, até o fim da vida me perguntava da Sílvia e Maria, da Tica, da Mary, da Bianca, da Clá, da Rê, da Erica. Essas últimas acho que gostavam mais de conversar com ele do que comigo, mas eu não tenho ciúme.
Pedia sempre pra eu repetir as histórias com elas. Era obcecado pelo conselho que dei pra Fernandinha quando ele nos levava pra outra casa noturna nos loucos anos 90. Tínhamos 14 anos e ela, a menor da turma, estava com medo de ser barrada: “joga o cabelo pro lado, faz cara de habitué e segue em frente”.
Ele me devolveu o conselho “faz cara de habitué” muitas outras vezes na vida. E ainda hoje, quando tenho medo de fazer alguma coisa, penso na voz dele falando isso pra mim, às gargalhadas.
Pra me convencer a mudar de escola quando achou que a que eu estava era fraca, apelou para “olha só, tu vai conhecer um monte de amiga nova". Topei na hora.
Em duas grandes viagens que fiz com ele e a mãe, levei amigas junto. E até hoje a gente lembra as piadas que fizemos, os hábitos peculiares (pepino no café da manhã, pedir pratos que não existiam no cardápio só pra complicar, gostar mais do metrô do que de qualquer atração turística, falar que em viagem tem programa pra um, pra dois, pra três e pra quatro, inventar apelidos para os personagens ou lugares marcantes), mas principalmente da felicidade dele de me ver ali, feliz e bem acompanhada com amigas da vida.
O pai adorava me chamar de agregadora - eu era aquela que puxava pra roda quem estivesse sozinha e que sempre tinha muitas amigas de turmas diferentes ao mesmo tempo. Então não sei se sou assim porque sou mesmo ou porque sabia que ele aprovaria. Como tenho outras prioridades na análise, nunca investiguei. Não deu tempo de contar pra ele da Lúcidas, mas acho que ele ficaria orgulhoso também. Seguirei tentando orgulhar ele daqui. E fazendo cara de habitué.
Na linha vai com medo mesmo (e já sabe, com cara de habitué), publiquei o primeiro trecho da entrevista que fiz com a criadora de conteúdo Jacira Doce. Desde a faculdade de Jornalismo eu sempre fui mais edição, redação e backstage do que câmeras e microfones. Não me acostumo com a minha voz, descobri que tenho um s sibilante e que tenho menos clareza do que gostaria pra perguntar, deu problema na ferramenta que escolhi pra gravar. Mas também descobri que me divirto muito no processo, entro em flow editando por horas, tenho uma curiosidade real que me move e talvez possa fazer isso a vida toda.
E um pedido: confere lá, dá uma moral e chama as amigas que a gente tem que espalhar a palavra da Lúcidas pra muito mais gente. 🧡👁️
Um beijo,
Lari Magrisso
Fundadora e editora-chefe
lucidas.cc
@lucidas.cc
que lindo, Lari <3